É de bico ou de dedão?

Por André Simões Louro
Foto: Fifa.com

Até na semifinal de Copa do Mundo já teve gol de bico. Ou de dedão?

De bico ou de dedão ? 

Não importa. O mundo do futebol, na maioria dos casos torce o nariz e chama de grosso quem chuta de bico, principalmente os comentaristas e corneteiros craques de carpete da sala da vovó. 

O jogador, no entanto, sabe da importância e da dificuldade de saber utilizar esse recurso, mormente o salonista. Aliás, esse recurso, nos anos 90, passa a ser enxergado com outros olhos por ser muito utilizado por Romário, via de regra, dentro da área para deslocar o goleiro. O Baixinho fez muitos gols e deixou muito goleiro e muito zagueiro sem pai nem mãe. Era cada agulhada... 

Nos anos 70 e 80, Serginho Chulapa surpreendia com seus chutes de dedão e, por vezes, de fora da área. Era um braço na cara do zagueiro da marcação e mandava a sapatada. 

Em meus tempos de aspirante a jogador, vi muitos utilizarem tal recurso com grande precisão, mas não vi ninguém chutar de bico com tamanha precisão, qualidade e elegância como fazia o Bigão. O cidadão era daqueles canhotos habilidosos dos quais nenhum time de futebol pode se dar ao luxo de não ter no elenco. Jogávamos no Beira Mar de São Vicente. Em verdade, tanto o Bigão como meu irmão Neto, jogavam na categoria de cima porque dois e três anos mais velhos, respectivamente. De maneira que jogar com eles somente nos treinos, mas esse camarada tinha um chute certeiro de bico que ficava difícil de entender como conseguia bater na bola desse jeito. Às vezes, sem ângulo. Outras vezes, em situações às quais qualquer outro bateria de peito de pé, de chapa ou de qualquer outra forma, menos de bico, mas ele mandava seus pombos-sem-asa das mais variadas formas e quase todas, inimagináveis. 

São coisas e situações que lembramos quando encontramos alguém da época, mas dessa vez lembrei por conta do falecimento do Velho Locatelli, o “Loca”, pai de meu amigo Fabricio, “Loca”, quem do pai não herdou somente o apelido, mas o tamanho e o grande coração, de modo que tão logo soube da má notícia, liguei para meu pai repassando o triste acontecimento e suas palavras primeiras foram: “O Loca foi um dos maiores cabeceadores com quem joguei e quem melhor chutava de bico. Aliás, chutava de todo jeito, mas tinha um chute de bico que era uma pancada. Pergunta ao Maneco Tavares que ele te fala”. 

Meu velho foi um bom jogador amador. Um meio campista ambidestro que colocava a bola onde queria, carregava-a entre as pernas, o que dificultava a marcação e, por outro lado, facilitava seus dribles para qualquer lado, além de ótima visão de jogo, mas não chutava de bico com a mesma categoria com que batia de peito de pé ou com os lados de dentro e de fora do pé. Assim como eu. Partilhamos da mesma inveja com quem tem bom chute de bico. Meu pai jogou muito na várzea de Santos e Cubatão, principalmente de Cubatão e sempre me falou da qualidade do agora saudoso Locatelli. Acho que chegaram a jogar juntos no veterano do Casqueiro, aliás, aquele veterano era de respeito.


Enfim, aos precipitados, devo alertar que antes de bradarem a plenos pulmões que bico é coisa de grosso, de beque que chutava para o lado que o nariz aponta, lembrem do Baixinho Romário, a quem Johan Cruijff chamou de gênio da grande área e com algum esforço lembrará de outros como lembrei aqui. O fato é que chutar de bico ou de dedão pode ser um recurso fantástico, o qual vi poucos saberem utilizar com destreza. Como disse aqui, quem melhor vi chutar de bico foi o Bigão no Beira, já meu pai disse que foi o Velho Loca e como ele viu ambos jogarem, podemos concluir quem foi o melhor chute de bico. Gostaria muito de ter jogado ao lado dele. 

Posso estar equivocado, mas segundo minhas anotações, ontem fez um mês do falecimento do Velho Locatelli e lembrando da conversa que tive com meu pai resolvi dividir essas mal traçadas linhas a respeito, em especial, porque além de bom de bola o pai do meu amigo foi um ser humano fantástico, do qual sempre ouvi boas histórias, seja como jogador de futebol amador, mas sobretudo como pessoa a praticar o tal do amor ao próximo tão falado e tão pouco praticado. 

Será que no céu dá pra chutar nuvem de bico? 

Aliás, é de bico ou de dedão?
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